quinta-feira, 10 de setembro de 2009

PERSONAGENS - Ti Serafim


--- Chamava-se, Serafim Fortunato Preto, e era natural do Concelho de Mogadouro, da Aldeia da Figueirinha, Freguesia de Travanca, onde nasceu no dia, 19 do mês de S. João, do ano de 1911.
Sem dúvida que se existe no nosso concelho tradição, de Danças de Paus, Gaiteiros e Caixeiros, é da Freguesia de Travanca, que nos chegam os mais antigos testemunhos.
É disso exemplo, “ ti Serafim”, era assim que era conhecido, hábil Caixeiro da aldeia da Figueirinha, que durante muitos anos, deu ritmo ao som da “ Gaita “, a Arruadas, Alvoradas e a Danças de Paus, pelas aldeias do Concelho de Mogadouro.
Contaram-me que fora por volta dos 15 anos de idade, que se iniciara no instrumento que o acompanhará pelo resto da vida, agricultor de profissão, dedicava-se á criação de gado bovino da raça autóctone, "a mirandesa"e era no final do dia de trabalho, que ensaiava as modas da época e que quando se achava capaz, as tocava em dias de festa da sua aldeia, Figueirinha e em terras vizinhas quando o chamavam.
Dizia que se lhe dava muito bem a sesta, em cima d’uma pedra mal amanhada, que ficava debaixo de uma parreira, que nascera e crescera, estribada numa das paredes da sua curralada, onde guardava o gado e que ainda hoje ali se encontra.
Com muita pena minha de não o ter conhecido pessoalmente, foi por meu grande amigo Rui Preto, neto do próprio, que tomei conhecimento de algumas das suas façanhas e proezas como homem, caixeiro e caçador.
Como testemunho do seu legado, deixou-nos a sua caixa, que ainda em vida, afirmava ter mais de 150 anos, embora esta não tenha encontrado sucessor à altura, é guardada com todo o respeito que merece pela família, se bem que não poucas vezes, tenha sido vítima de pancadas menos melódicas, por parte de alguns curiosos, “como eu”, que não resistem ao velho e tentador instrumento.
Recordo hoje algumas das noites geladas de inverno, daquelas que não se pode andar na rua, passadas em casa do Rui, “neto”, junto da lareira dos seus anexos, na companhia de mais um ou outro amigo, quando depois de um petisco, "por vezes bem regado", este me pedia, “ bá… vai lá buscar a viola e toca lá uma musiquinha”, pedido ao que com todo o agrado acedia, nunca antes sem que este disse-se, “ou, espera aí q´eu já vou buscar a caixa do meu avô”, bons tempos que de quando em vez, não deixam de se repetir. Eis que chegava o Rui sorridente, qual criança com brinquedo em mãos, dizendo “agora é que baí a ser agora ...”, dizendo de seguida o Geiras, “bota cá q´eu toco”, ao que o Rui respondia, “calma espera aí… devagar e sempre já dizia o meu avô”, era sempre necessário colocar o velho instrumento junto da lareira, para que assim aquece-se e as peles de animal que o compõem, ganhassem a elasticidade conveniente para que as cordas laterais se conseguissem apertar, fazendo assim com que o velho instrumento, conseguisse reproduzir o seu som original.
Era então que munidos dos respectivos instrumentos, lá saía uma ou outra musiquita, tocada e cantada, como as mãos e as gargantas o permitiam.
Quanto ao ti Serafim, verdadeiro protagonista desta crónica, deixou de tocar as 85 anos, por força das pernas, que o impediram de fazer aquilo que mais gostava, faleceu com 93 anos de idade, em Mogadouro na casa da Família.



--- Agradecimentos à família pela disponibilização das fotos, com que ilustrei este texto.

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